Cátia Diogo: De Secarias a Bratislava, com uma pandemia pelo meio

Escrito por

Catarina Correia Martins
26 Novembro 2020

Cátia Diogo tem 24 anos, é de Secarias, no concelho de Arganil, e há cerca de 10 meses que mora em Bratislava. Um projeto de voluntariado levou-a para a capital da Eslováquia, mas mal sabia que, nos seus primeiros meses, estaria fechada em casa.

Licenciada em Teatro e Educação, primeiro, e em Cinema Documental, depois, estava à procura de trabalho quando conheceu o Corpo Europeu de Solidariedade (CES). Não conseguia encontrar qualquer estágio na sua área em Portugal e, por isso, um projeto de voluntariado que pudesse relacionar-se com a sua formação, pareceu-lhe uma boa opção. Entre inscrever-se e ser aceite passou cerca de um mês. Num momento estava à sua secretária a preencher um formulário e um mês depois aterrava na Eslováquia.

O CES tem, de acordo com Cátia Diogo, vários projetos de voluntariado por toda a Europa e nos países limítrofes. Aquele em que foi aceite consistia em trabalhar com uma organização, «tirar fotografias a alguns eventos, fazer alguns vídeos para que possam usar como divulgação», é também responsável por gerir o Instagram da entidade e, mais recentemente, tem a seu cargo a elaboração de uma brochura sobre um evento que teve de ser adaptado às novas condições impostas pela pandemia.

Chegou em fevereiro e duas semanas depois viu-se numa situação que não imaginara: «A minha adaptação aqui foi um bocadinho cómica porque eu cheguei e passadas duas semanas entrei num lock down. Ficámos fechados quase três meses, em que não podíamos sair de casa, se não para ir ao supermercado e apenas ao mais próximo da habitação. Por isso, a minha integração foi interrompida abruptamente», conta. Cátia Diogo considera que esta primeira fase «vai ficar sempre marcada» e que a sua experiência acabou por «não ser a 100%», uma vez que viu muitos dos trabalhos que ia fazer, serem cancelados ou tomarem novos moldes. Ainda assim o balanço que faz é positivo: «Foi uma experiência diferente e nova. Levo daqui boas experiências, boas pessoas que conheci, o meu inglês melhorou muitíssimo e abriu-me novos horizontes para quando o projeto acabar».

O país

Quando rumou a Bratislava «não tinha muitos conhecimentos nem expectativas»: «Vim muito na expectativa de conhecer e saber mais sobre algo de que eu não tinha ideias pré-concebidas», recorda. A situação que o mundo atravessa não ajudou a que ficasse a saber tanto quanto poderia ter ficado noutra altura acerca do país, no entanto Cátia Diogo diz que aproveitou «os meses de final da primavera e de verão», em que as «medidas foram levantadas em parte», para conhecer um pouco mais. «Optei por não me movimentar muito. Toda a parte da Eslováquia mais longe de Portugal não conheço muito bem porque optei por não visitar. Tenho uma pequena noção do que é o país, de algumas tradições, isso sim, mas porque quis saber e aproveitar o pouco tempo e as poucas oportunidades para conhecer um pouco mais», refere.

Dos usos e costumes eslovacos, conta que experimentou «algumas comidas [tradicionais], não todas». «Não é uma gastronomia que eu acorde de manhã e queira comer», brinca. Aponta também que, na esmagadora maioria das casas, os sapatos ficam à porta e que, na casa de banho, há duas divisões separadas, uma para a sanita e outra para o chuveiro ou banheira e lavatório. «Ao princípio foi muito estranho para mim não ser tudo no mesmo sítio», afirma.

O CES proporcionou-lhe formação na língua local, durante três meses, mas confessa que não é um idioma «à primeira nem à segunda». Apesar disso, considera que «há coisas a que, passado um tempo, nos habituamos e percebemos os códigos da língua». Hoje, quase 10 meses depois da sua chegada, diz que «já é muito mais fácil» movimentar-se em pequenas coisas como ir a um supermercado, uma vez que já é capaz de «gerir pequenas conversas».

A relação de uma portuguesa com Portugal

Estar longe, impossibilitada de vir a Portugal e «não ter uma ligação diária de falar todos os dias português ou ver televisão» podia distanciá-la do seu país de origem, mas não foi o que aconteceu. «Descobri coisas novas sobre mim e sobre a minha relação com Portugal. Antes disso, pensar que sou portuguesa era um dado adquirido, depois disso passei a ter mais respeito pelo país», revela.

Também as efemérides passaram, para si, a ter outro significado. «Nos feriados, pesquisei mais sobre a História de Portugal e voltei a lembrar-me de coisas que aprendemos na escola e de que nos fomos esquecendo», conta. Estar longe «fez com que eu criasse uma nova relação com as minhas raízes e voltasse a descobrir a nossa História», reitera.

O bilhete de volta

Em dezembro, o seu projeto termina e Cátia quer regressar a Portugal. Não sabe ainda se consegue por força da pandemia e das limitações, ao nível das fronteiras, que os países podem impor.

Depois da experiência que tem vivido, considera que, se no regresso, «não conseguir outra vez arranjar um estágio ou um emprego», tem «uma mentalidade muito mais aberta para tentar coisas novas e mais individuais, em que não esteja à espera dos outros», no entanto, na sua cabeça, tem algumas metas delineadas. «Quero ver se consigo um emprego e, em setembro do próximo ano, candidatar-me a um mestrado internacional, em que tenha oportunidade de viajar um bocadinho mais», revela. Caso essa oportunidade não surja, afirma que quer começar «finalmente» a escrever os seus próprios filmes. Num bloco de notas tem apontados tópicos: «Durante este tempo, tenho tido imensas ideias para contar histórias do nosso país, da região de onde sou e de onde nasci, se calhar é altura de lhes pegar, continuar a desenvolver e quem sabe dar um filme», avança. Ficamos à espera, Cátia!

Deixe aqui a sua mensagem

Outros posts

Joana Cunha: O bom e o mau da maternidade

Joana Cunha: O bom e o mau da maternidade

Foi no início de maio que “A Mãe Joana” viu a luz do dia. Os textos que retratam a experiência da maternidade de Joana Cunha chegaram finalmente ao público, depois de cinco anos guardados na gaveta.

Elsa Lopes: Viver com lúpus

Elsa Lopes: Viver com lúpus

Elsa Lopes tem 34 anos e há cinco descobriu que tem lúpus, uma doença crónica que lhe mudou as rotinas e o aspeto físico. Hoje, diz-se uma mulher «feliz, dentro das limitações».