Ana Rita Vaz é, desde pequena, apaixonada pelas tintas e pelas artes no geral. O que nunca pensou é que, um dia, a sua profissão a levaria a fazer arte nos corpos das pessoas. Hoje é esteticista, maquilhadora, manicura, tatuadora, formadora e será tudo aquilo que se sentir desafiada a fazer…
“Sempre me liguei muito às artes”
Ana Rita Vaz, de 25 anos, contou ao Populus que, na infância, «como qualquer garota, queria ser tudo ao mesmo tempo», e diz nunca ter tido «uma ideia bem definida». No entanto, «tinha mais afinidade com certas coisas»: «Sempre me liguei muito às artes. O meu pai sempre foi muito bom a pintar em telas, o meu tio também… Não vou dizer que tenho aquilo no sangue, porque não sei, mas o que é certo é que me influenciei um bocadinho por eles e tudo o que fosse tintas [me fascinava]… Canetas, lápis, maquilhagem, vernizes… Passei um mau bocado na infância porque a maquilhagem era um vício terrível. A minha mãe chegou a pôr fora todas as maquilhagens, daquelas das miúdas, que eu tinha, porque eu pintava-me todos os santos dias. E tantas vezes que pintava as unhas com corretor nas aulas, lembro-me disso perfeitamente», recorda a nossa protagonista.
Apesar deste seu gosto, não descobriu cedo a profissão que hoje tem. Durante o ensino secundário, diz ter-se sentido tentada a seguir estudos superiores, pela “pressão” da tradição académica da cidade onde vive, Coimbra, mas também pelo facto de esse ser o caminho mais óbvio e também o mais escolhido pelos seus amigos. Se tivesse ido para a universidade, Psicologia teria sido a escolha. Porém, a certa altura, a decisão pareceu óbvia na sua cabeça: «O que eu quero é estética, maquilhagem, uma coisa assim…». «Ainda me lembro de a minha professora de Português, na altura, ficar um bocadinho indignada e eu disse-lhe mesmo, em frente à turma toda: “Eu vou tirar um curso de estética e essa vai ser a minha vida”», lembra.
Mulher de ideias fixas, “se bem o pensou, melhor o fez”. Quando terminou o ensino secundário, Ana Rita decidiu procurar as opções que melhor lhe convinham dentro da área que gostava. Uma vez que, por motivos financeiros, estava fora de questão sair de Coimbra e as academias de maquilhagem, à época, existiam apenas em Lisboa e no Porto, a jovem procurou alternativas. «Pensei que em vez de estar a fazer um investimento tão grande – o curso custava cerca de três mil euros – indo só para a parte da maquilhagem, porque não associar a estética? Há-de haver algum curso que tenha maquilhagem incluída», conta.
O apoio dos pais
Apesar de não fazer o percurso tradicional, isso nunca foi um problema para os pais, que sempre a apoiaram. Quando se deslocou a uma academia, em Coimbra, para se informar acerca dos cursos, fez-se acompanhar da mãe e do pai, «que esperou no carro». Este é um episódio que, garante, vai lembrar «para o resto da vida». «A secretária virou-se para mim e disse que o curso de Estética e Cosmetologia [que acabou por fazer] custava seis mil euros. Caiu-me a ficha e pensei: “Pronto, nunca na minha vida”. Não tinha bem a noção do dinheiro, mas sabia que aquele valor era um absurdo». Naquele dia, Ana Rita diz ter saído da escola «tão desiludida» que começou logo a ponderar as outras opções.
Quando chegaram ao carro e contaram a nova ao pai, este perguntou-lhe se era mesmo isto que queria, uma vez que não teriam dinheiro para lhe pagar o curso. «Passado uma semana, chegaram a casa e disseram que tinham contraído um crédito bancário para me pagar o curso. Ainda hoje me lembro disso e vêm-me as lágrimas aos olhos», recorda Ana Rita que garante que, a partir daí, fez «o que tinha que fazer»: dedicar-se ao máximo e vingar na área.
A criação do próprio negócio
Ainda antes de terminar a sua formação, Ana Rita já fazia «uns biscates em casa»: «Na nossa área, é muito fácil ainda estarmos a estudar e arranjarmos um cantito em casa para começar a atender alguns amigos e familiares e, assim, ganhar uns trocos», conta. Nessa fase, uma das suas clientes propôs-lhe ir trabalhar para um salão, e Ana Rita não hesitou. «Queria trabalhar, queria aprender…», afirma.
Nesse salão, trabalhou como esteticista, durante um mês. Até que foi convidada a fazer uma parceria com uma cabeleireira, que já tinha um salão, para começar o seu próprio negócio. Diz que não foi «de meios modos»: «As oportunidades são para agarrar, quando surgem, e assim fiz», lembra.
Foi a partir desse momento que Ana Rita diz ter começado a «ter uma noção do que era gerir um negócio, ganhar alguma responsabilidade, gerir os horários, as clientes, as folgas, o ordenado, o dinheiro…», afirma. Desde então que nunca mais trabalhou por conta de outrem e há cerca de dois anos que está sozinha no negócio.
A jovem empreendedora considera que esta opção a tornou «muito humilde, muito responsável e muito organizada», mas lhe trouxe uma «única desvantagem»: «Tenho que fazer sacrifícios, a nível pessoal, familiar, não posso ter todo o tempo do mundo para mim, porque se eu trabalho, recebo, se não trabalho, não recebo, e as contas são para pagar», atira. Ana Rita conta, com orgulho, que desde que começou a trabalhar nunca mais pediu «uma moeda que fosse» aos pais. «Eles já me deram a enxada de trabalho, agora tenho de fazer a minha parte», reitera.
Foi também a partir deste momento que começou a perceber a dificuldade que é, por vezes, lidar com as clientes que nem sempre «têm consciência»: há pessoas que «mandam mensagem à hora que lhes apetece, outras vezes é à hora que têm oportunidade de o fazer. Há pessoas que nos desrespeitam de propósito, outras que nem se lembram e logo de seguida mandam mensagem a pedir desculpa porque não se lembraram que era o meu dia de folga», diz. No início, diz ter lidado «mal com isso, desligava o telefone e não respondia», todavia, hoje em dia, vive «com a agenda colada ao corpo»: «Respiro fundo, tento ser o mais simpática possível, estou de folga mas também não é por perder cinco minutos a responder uma mensagem que vou morrer», refere. Outra das facetas complicadas de lidar com o público liga-se com o facto de as pessoas «terem marcação feita e não aparecerem, sem dizer nada». Mas também para isso Ana Rita arranjou solução: «Falham-me uma, falham-me duas, falham-me três, à quarta não atendo, nem marco mais. As pessoas terão de ir a outro lado», aponta.
A informalidade que prende as clientes
Desde o começo que Ana Rita mantém um traço: «Sou muito eu, quer gostem, quer não». Diz que no seu salão «não há doutores» ou «classes sociais» e, com as clientes, formou «uma família». Sabe que aquele espaço, para muitas clientes, além de ser um local de relaxamento, é, por vezes, um refúgio: «Ainda ontem uma cliente chorou à minha frente, a contar problemas familiares», exemplifica.
Sabe que o melhor marketing é o “boca a boca”: «Tu fazes um bom trabalho, és bom para aquela pessoa, sabes que fizeste bem, sabes admitir o teu erro – que é muito importante e as pessoas valorizam –, então as cliente ficam fixas e agarradas para sempre», considera. Ainda que saiba que nada é garantido. «Tinha à volta de 250 clientes fixas, agora quando enviei mensagem a dizer que ia reabrir [depois de algum tempo fechada, devido à COVID-19], apenas cerca de 80 responderam, e muitas delas disseram que ficaram desempregadas e que agora não podem vir».
Não parar de aprender
Já com uma série de valências na sua área profissional, Ana Rita não quis parar e fez o curso de formadora, dando agora alguns workshops no seu salão e formação de nail art numa academia. «Tem sido uma recompensa muito boa, porque uma coisa é trabalhar na área, outra é poder dar-me ao luxo de dar aulas naquilo que domino», afirma.
De acordo com Ana Rita, «o caminho da nail art é muito complicado porque em Coimbra não há muita adesão. Há muito boas formadoras, mas fora desta cidade», revela. O seu objetivo é tornar-se na «melhor formadora de nail art em Coimbra», ainda que a princípio as unhas não fossem, de todo, uma paixão.
À pergunta “sentes-te realizada?”, responde que «nunca» se vai sentir realizada porque é «uma pessoa que não se contenta com nada, que vai sempre tentar ir mais além e experimentar coisas novas», afirma. Ana Rita diz que não gosta de «rotinas, nem de estagnar» e que, por isso, procura sempre «evoluir», algo que faz parte da sua «vertente de empreendedora, que nem sabia que tinha». «Agarro as oportunidades quando elas surgem e isso é que é ser um bom empresário», termina.